Guia para uma visita
A FRONTARIA
A fachada exterior do templo, de elegante linha franciscana setecentista (1725), é marcada por um largo arco abatido, cerrado por um portão de ferro.
Por cima do arco abre-se um nicho que recolhe urna bela imagem do Padroeiro, da mesma época.
Dois janelões, um óculo elíptico, pináculos laterais e uma cruz cimeira completam o conjunto de singela harmonia.
O ÁTRIO OU GALILÉ
Cruzado o portal, entra-se num átrio acolhedor cuja abóbada, ornada de brasão real, suporta o coro supra-estante.
A parede esquerda está decorada com dois painéis de azulejo, de feitura deste século, alusivos a Santo António e à Figueira (desenhos da Igreja, de barcos e de pescadores) e brasão da Misericórdia.
Em frente, abre-se a porta principal do templo, com moldura de pedra lavrada em plateresco.
Na parede direita um armário conventual do século XVIII e uma porta pequena que dá acesso ao coro.
O CORO
A subida para o coro – local de reunião comunitária dos frades para as orações e vigílias da Regra – faz-se por uma escada estreita, no início da qual existe ainda o vão que, outrora, devia estabelecer comunicação com o corredor das celas.
O coro é ocupado por um cadeiral simples e robusto de duas ordens, do século XVIII, no espaldar do qual corre um painel de 13 tábuas pintadas por artista desconhecido mas de saboroso gosto popular.
De acordo com a interpretação do prof. Victor Guerra, essas tábuas representam:
1.a — Nascimento de Fernando de Bulhão (depois Santo António), em 15 de Agosto de 1195, em Lisboa, filho de pais de alta estirpe e cargos importantes na corte de D. Sancho 1.
2.a — No Outono de 1220, Fernando de Bulhão, inflamado pelo ideal do martírio sofrido por cinco franciscanos em Marrakech, trocou a ordem de Santo Agostinho pela de São Francisco, renunciando aos apelidos fidalgos e passando a chamar-se, simplesmente, Frei António.
3.a — Primeiro sermão de Frei António, na cidade italiana de Ferli. Tal admiração provocou que logo foi nomeado pregador da Ordem Franciscana, vindo a deslumbrar Roma e a apaixonar Assis.
4.a — O Divino Infante’ aparece ao nosso Santo, em casa de Tison III, conde do Campo de Sampiero. Destacam-se, no primeiro plano, os seus atributos mais representativos: o Livro, símbolo dos Doutores, e o Lírio, a caracterizar a castidade sem mancha do discípulo de S. Francisco.
5.a — Uma criança cai numa panela de água a ferver, na ausência da mãe que imprudentemente se afastara para ver Frei António, quando passava na rua, e é salva por valimento do Santo.
6.a — A um penitente paduano, de nome Leonardo, que se acusara de ter dado um pontapé na mãe, Frei António diz: «O pé que insulta o pai e a mãe deveria ser logo cortado».
Aquele, muna crise de contrição, toma à letra a frase e amputa, cerce, o pé, mas o Santo intervém e, impondo as mãos sobre a chaga, põe a caminhar o pecador.
7.a — S. Francisco de Assis — é a tábua central, mestre espiritual de Santo António.
8.a — O cavalo faminto dum dos chefes da heresia albigense, Bonvillo, em Tolosa, à voz de Santo António, abandona o pascigo abundante que lhe tinham ministrado e prostra-se em adoração ante o S.S. Sacramento.
9.a — O glorioso franciscano prega aos peixes, na foz do Rio Marecchia, em Rimini, os quais o ouvem dócil e atentamente, confundindo assim os obstinados herejes maniqueus.
10.a — Milagre da bilocação. Santo António, embora em Pádua, surge em Lisboa, em 1227, e ressuscita um morto, para salvar o seu pai, a caminho do garrote, como suposto autor de homicídio.
11.a — A opressão diabólica sofrida pelo nosso Santo, já Provincial Franciscano, na sua cela, na cidade de Antenor, quando, na Quaresma de 1228, descansava da sua labuta apostólica.
12.a — No entardecer do dia 13 de Junho de 1231 subia para o céu a alma do virtuoso e douto Frei António, glória da O.F.M., ocorrendo o seu passamento em Santa Maria d’Arcoeli, à beira de Pádua, numa igreja da mesma invocação daquela em ‘que, pelo baptismo, havia renascido para a graça — Santa Maria Maior da Sé de Lisboa.
13.a — E, em menos dum ano decorrido — caso único—, em 30 de Maio de 1232, Frei António de Lisboa é elevado às honras dos altares pelo Pontífice Gregório IX, que no momento da canonização o proclama de «Doutor optime, Lumen Eclesiac Sanctae».
Sobre a cadeira do abade-mor, domina um Cristo crucificado e sofredor.
Ao meio do coro está colocada uma estante piramidal com livros do Convento, de liturgia e cantochão.
Sob a janela lateral expõe-se um belo crucifixo, em madeira, do século XVIII.
Na parede esquerda expõem-se a Bandeira da Misericórdia e um pequeno mas delicioso quadro com as cabeças do santo e do Menino (século XVII ?).
A NAVE
A nave é de estrutura simples com as paredes revestidas de azulejos policromados do século XVII.
Nela pode observar-se
— Na parede lateral direita.
– Uma bela imagem manuelina, século XVI (provavelmente da fundação do templo), em pedra policromada da Virgem com o Menino — conhecida por Nossa Senhora da Boa Viagem.
– O púlpito sobre balcão de pedra trabalhada.
– Uma porta baixa de acesso ao antigo claustro.
– Um altar lateral, com a imagem do S. Francisco, em madeira, do século XVII.
– Um nicho com uma imagem da Virgem e o Menino, em madeira, de graciosa feitura popular, também do século XVII.
— Na parede lateral esquerda.
– Um elegante pórtico neo-clássico, com um belo gradeamento, que dá acesso a uma capela do século XIX e que, pelas suas dimensões, constitui um outro pequeno e requintado templo que forma com a Igreja de Santo António um curiosíssimo conjunto. Essa capela é pertença da Ordem Terceira de S. Francisco, possuindo belíssimas peças escultóricas, merecendo igualmente ser visitada, em complemento.
– Uma tela com a Sagrada Família, séc. XVIII.
– Um outro pórtico, de linha renascença, abre para a Capela do Senhor da Vida, a que se fará referência pormenorizada mais adiante.
– Um altar com imagem do Santo António com o Menino, similar à de S. Francisco já referida.
– Um nicho com uma bela imagem de S. Pedro, plena de espiritualidade, em pedra que foi policromada, do século XVI.
– Os dois altares laterais referidos, bem como o altar da capela-mor, são do início do século XVIII e procedem do extinto Mosteiro de Santa Maria de Ceiça, no Paião, e foram repintados e doirados por artífices de Braga em 1984.
A CAPELA DO SENHOR DA VIDA
Esta capela lateral, do século XVII, foi recentemente restaurada e remodelada.
No pavimento lajeado sobressai uma pedra tumular (de João Homem Frade, 1613 — muitas outras terão existido em todo o templo mas removidas durante o restauro de 1886).
A abóbada é de pedra, em caixotões.
As paredes estão decoradas com azulejos recentes, de inspiração barroca, manufacturados por artistas de Condeixa.
Frente à janela podem admirar-se dois bons baixos-relevos em madeira policromada, dos finais do século XVII, que deviam fazer parte dum conjunto que se perdeu (possivelmente procedentes, também, do Mosteiro de Ceiça).
O retábulo, em pedra, serve de moldura a um belo Cristo crucificado, imagem em estanho policromado, de impressionante humanidade, conhecido pelo Senhor da Vida e de grande devoção e tradição local. A sua história, extraída dum documento antigo, é a seguinte:
A imagem do Senhor Bom Jesus da Vida esteve por muitos anos recolhida e occulta em uma casa de uma família antiga d’esta Villa, tendo-a mandado vir directamente da Italia.
Em 1833, pela occasião epidemica do cholera morbus, os habitantes d’esta Villa e póvos circumvisinhos foram devastados pela epidemia, e alguem sabendo d’aquela imagem occulta vendo-se no leito da dôr e a braços com a morte pelo terrivei mal, recorreo com fervor e devoção áquela imagem do crucificado pedindo-lhe Vida: o Senhor ouvio seus rogos. Outros muitos dirigem á milagrosa imagem suas vozes aflitas, e suas supplicas por tal forma foram acceites, que infinitas graças concede dando Vida a muitos; e é d’esta epocha que o nome lhe deram, que até hoje dura, do Senhor Bom Jesus da Vida.
Foi desde então que a devoção para com esta milagrosa imagem se espalhou por toda a parte, e por tal forma, que a visital-a se apinhava immensídade de povo em romaria, na sua casa da Praça Nova, d’esta Vila, do que ainda conserva o nome da imagem. Esta propriedade passou á posse do Senr. Joaquim Pereira Pestana, nascido nesta Villa, mas residente na Bahia, imperio do Brazil, bemfeitor por si e seus amigos d’esta Santa Casa da Misericordia.
Quando este Senr, a braços com a sua vida comercial se acha acometido d’uma grave enfermidade, á beira da sepultura, de lá mesmo recorre com fervorosa devoção á imagem do Senhor Bom Jesus da Vida que na sua casa d’esta Villa se achava. O Senhor digna-se ouvil-o e salval-o d’esta enfermidade de paralysia do lado direito e em breve tempo melhora.
O Senr. Pestana confirma esta verdade com a sua assignatura em 2 de Janeiro de 1863, offerecendo, então, a Veneranda imagem á Santa Casa da Misericordia, recomendando á Meza da mesma Santa Casa, em testemunho da sua gratidão e reconhecimento, a trasladação da imagem da sua casa para esta capela, afim de melhor ser reverenciada e acatada, como merece, e visitada com fervor dos póvos que a ela continuamente recorrem: o que effectivamente se fez em 26 de Março d’aquele anno de 1863.
À esquerda um curioso vão de confessionário.
A CAPELA-MOR
Na capela-mor, subsistem alguns elementos do templo primitivo, tais como : o arco-mor, de simples mas fino manuelino, encimado pela pedra de armas dos Senhores de Tavarede; duas pequenas pias de água benta; uma laje tumular do benemérito D. António Fernandes de Quadros, ali sepultado em 1540. A laje tumular, em que se pode ler ainda um resto de inscrição «Cavaleiro da Ordem de Cristo.. », cobre duas criptas laterais, com acessos lajeados, que conservam numerosas ossadas.
No altar podem admirar-se várias peças notáveis: o sacrário e o baldaquino, barrocos, em talha dourada: uma belíssima imagem, em madeira, de Nossa Senhora dos Navegantes, também barroca; e um Cristo magnífico, do século XVI (?).
A parede lateral direita é ocupada por quatro bons quadros de escola portuguesa quinhentista: Santo António livra o pai da forca; o milagre da mula; a pregação aos peixes; a morte do Santo.
A porta direita dá para o interior do antigo Convento, hoje lar da terceira idade; a da esquerda para a sacristia.
A SACRISTIA
A sacristia, adaptada provavelmente em 1886, é ocupada por um belo arcaz do século XVIII, sobre o qual se expõem uma imagem de roca (séc. XVIII) de Nossa Senhora da Conceição, de grande devoção local; e duas valiosas imagens (séc. XV), em pedra policromada, de S. Estêvão e S. Benedito.
Em armários-vitrinas guardam-se alfaias e paramentos litúrgicos, sendo de realçar: um pluvial do século XVI-XVII, uma casula do século XVIII e um cálice de prata. Também um pequeno espólio de objectos vários recolhidos durante as obras de restauro.
undefined